Após participar de um evento em Porto Alegre, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, defendeu em entrevista exclusiva à Acústica FM, que o debate sobre o tema das mudanças climáticas deve ocorrer em âmbito estadual, municipal e federal. Segundo a titular da pasta, a agenda ambiental não é novidade no país, mas, neste contexto de aceleração dos desastres naturais, precisa ganhar uma dimensão maior. Marina avalia que todos os candidatos a prefeito no Brasil precisam trazer a pauta para o debate.
“Essa é a agenda de sempre, não é nova e está posta há mais de 30 anos. Agora, ela tem que ganhar a dimensão que precisa, porque os eventos climáticos extremos já estão acontecendo, como aconteceu aqui no Rio Grande do Sul. Na região Serrana do Rio, houve um momento em que se perderam milhares de vidas; tivemos perdas de vida no ano passado em São Sebastião, no sul da Bahia e em Pernambuco. O Brasil todo é um país vulnerável. Temos estudos científicos de uma série histórica de 12 anos do Cemaden, que indicam que existem 1.942 municípios vulneráveis à mudança do clima. Por isso, o Plano Clima trabalha a agenda de mitigação, e nós fornecemos um plano para o centro de governo da agenda de enfrentamento dos eventos climáticos extremos. Portanto, é necessário sair da gestão do desastre para a gestão do risco. Essa agenda tem que estar no debate municipal em relação à adaptação, mitigação e transformação das cidades em espaços que sejam resilientes à mudança do clima, com um olhar para os mais vulneráveis. É uma discussão que precisa ser feita por todos os candidatos, independente do recorte ideológico e político; só os negacionistas é que não farão esse debate”, apontou Marina.
Questionada pela Acústica FM sobre a discussão em torno do controle dos sistemas de proteção contra cheias levantada pelo ministro da Casa Civil, Rui Costa, Marina afirmou que a responsabilidade deve ser compartilhada, mas ressaltou que o governo federal precisa manter a ajuda com recursos. No final de maio durante entrevista coletiva em Porto Alegre, Costa informou que a modernização, adaptação e a criação dos sistemas de proteção contra as enchentes deverá ficar sob tutela do governo do Estado, com recursos da União.
“As cidades, os estados e as comunidades precisam estar preparadas, e o Sistema Nacional de Meio Ambiente, ou mesmo o processo que envolve o pacto federativo, tem competências para cada ente federado. Cada atribuição tem que ser exercida de acordo com a capacidade de resposta que cada ente tem. No caso do Rio Grande do Sul, há uma complexidade, e não tem como os estados resolverem sozinhos, nem os municípios. É necessária a ajuda do governo federal, e é por isso que até criamos o ministério extraordinário para ajudar nesse processo de reconstrução. O Ministério do Meio Ambiente trabalha com protocolos para que possamos fazer essa reconstrução em bases sustentáveis, do ponto de vista ambiental, social, econômico e até mesmo cultural”, defendeu.
Antes da entrevista, a ministra Marina Silva participou de atos partidários da Rede Sustentabilidade, às vésperas do período eleitoral. Pela manhã, Marina esteve presente em um encontro com a deputada federal Maria do Rosário (PT) sobre estratégias e ações climáticas que podem ser adotadas em Porto Alegre. O tema deve ser o foco de toda a campanha da petista.
Segundo a ministra, o Brasil tem um déficit de aproximadamente 10 milhões de hectares em Áreas de Preservação Permanente (APPs). Ela alertou que, desses, cerca de 700 mil hectares referem-se ao território do Rio Grande do Sul.
“Em 2021, o Congresso aprovou uma lei que permitiu que municípios avançassem para construções em margens de rios, córregos, lagoas e encostas. O discurso naquela época era que os ambientalistas prejudicavam o desenvolvimento e a criação de empregos. Acontece que isso tem um peso quando ocorrem eventos climáticos extremos. O espaço do rio é do rio; é preciso de um lugar correto para a construção e com moradias que sejam dignas”, ponderou Marina Silva.
Durante o evento, foi entregue à ministra a Carta das Agroflorestas e Soluções Baseadas na Natureza. O documento reúne mais de 5,1 mil assinaturas de pessoas físicas e cerca de 450 de organizações, instituições e movimentos. A ideia é reunir propostas para a reconstrução do RS por meio dos sistemas agroflorestais.
Uma das propostas elencadas no documento é a construção de um canal de diálogo entre governo e comunidades atingidas, baseado na análise da paisagem pelo seu viés polissêmico e integrativo. Os coletivos também defendem um programa emergencial de adesão voluntária para o assentamento de populações rurais e urbanas, voltado a famílias atingidas pelas enchentes.