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UTI do Hospital de Canguçu segue fechada

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Janelas fechadas, colchões para cima e aparelhos desligados. Silêncio. A Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) do Hospital de Caridade de Canguçu permanece fechada. E, o pior: sem perspectiva de os dez leitos voltarem a estar à disposição da comunidade. Uma vistoria realizada por técnicos do Ministério da Saúde em serviços da Rede de Urgência e Emergência, entre os dias 15 e 18 deste mês, transforma-se em esperança às lideranças da região. 

A expectativa é de que o valor da Autorização de Internação Hospitalar (AIH) das UTIs possa pular dos cerca de R$ 470,00, por dia, por paciente, para mais de R$ 800,00. “Vamos buscar a requalificação desses leitos. Hoje, os hospitais recebem o equivalente à meia diária. Queremos avanços”, afirma o coordenador adjunto da 3ª Coordenadoria Regional de Saúde (CRS), Gabriel Andina, mas destaca que as possíveis melhorias não devem ser imediatas. 

Enquanto isso, em Canguçu, o momento é de indefinição. Ao se pronunciar na manhã de sexta-feira, o diretor administrativo do Hospital de Caridade, Régis Silva, reiterou: “Não temos perspectivas positivas”. Para recolocar a UTI em funcionamento, não bastam verbas emergenciais. A disponibilidade de recursos precisa ser permanente. E só para suprir os custos da Unidade são necessários, pelo menos, R$ 150 mil, por mês. Os novos valores pagos pelas AIHs, portanto, chegariam como fôlego.

 

Insustentável

A falta de pagamento da equipe médica, ao longo de cinco meses, acabou por forçar a interrupção das atividades na UTI. Desde a segunda-feira, 1º de agosto, não há prontuários nos escaninhos. Não há pacientes. Há apenas um cartaz de desinfecção afixado na porta, uma dívida que ultrapassa os R$ 400 mil e uma indagação, sem resposta: quando a UTI voltará a funcionar? A Unidade com duas áreas de isolamento, raios X portátil e uma série de equipamentos segue credenciada. Mas segue, também, envolta em dúvidas.

 

Transferências inevitáveis e tratamento longe de casa

Em 12 dias, 19 pacientes que buscaram atendimento no Hospital de Caridade tinham indicação de ser internados em UTIs e oito acabaram transferidos; todos para Pelotas. Só na tarde de sexta-feira, quatro pessoas – com quadros de Acidente Vascular Cerebral (AVC) e pós-infartados – permaneciam monitoradas, de perto, mas em leitos clínicos, nas enfermarias. Uma condição longe da ideal. 

Na última terça-feira, o médico Felipe Müller falou sobre a pressão de manejar os pacientes e estabilizá-los no Pronto-Socorro (PS), sem a retaguarda da UTI, em meio aos apelos para que possam permanecer na cidade, junto à família. “É uma situação de estrangulamento”, desabafou e fez questão de lembrar que, por meses, o corpo médico manteve os plantões sem qualquer previsão de receber os salários; tanto que o endividamento geral do hospital, só com a classe médica, beira os R$ 2 milhões. 

É um panorama que afeta a comunidade. O aposentado Mário Adi Coelho Nunes, 67, sentiu na pele. Teve um quadro grave de embolia pulmonar diagnosticado na quinta-feira, 4 de agosto, e, com a UTI fechada, precisou ser encaminhado para Pelotas. “É um caos. Um Estado falido em que não há dinheiro para nada: nem para saúde, nem para segurança ou educação”, afirma o filho, o bioquímico Juliano Nunes, 34, funcionário do Hospital de Caridade. Na sexta, o idoso permanecia internado na Clinicamp, pelo Instituto de Previdência do Estado (IPE), mas já estava no quarto.

 

A posição da 3ª CRS

O coordenador adjunto da 3ª CRS, Gabriel Andina, admite a situação delicada por que passa o Hospital de Canguçu, mas defende que a crise financeira enfrentada pela instituição vai bem além dos R$ 391 mil de repasses atrasados do governo do Estado. “O hospital vai ter que se adequar à realidade de crise e reduzir despesas para caber na receita”. Do contrário, as liberações emergenciais de verba serão, sempre, medidas paliativas. 

Quanto ao fechamento da UTI, Andina foi objetivo: “Fica complicado de eu fazer qualquer comentário. Formalmente, a 3ª CRS não foi comunicada. Só falaram em uma higienização do local”. Fica, portanto, a expectativa para os desdobramentos da visita do Ministério da Saúde à região.

 

Algumas tratativas e definições

– Bancos: A direção do hospital já deu início às tratativas com os bancos. Juntos, os empréstimos com Banrisul, Caixa Econômica Federal (CEF) e Unicred engolem aproximadamente R$ 250 mil, por mês. A proposta é de que as instituições financeiras possam prorrogar o pagamento das dívidas, para que o hospital só volte a pagá-las a partir dos primeiros meses de 2017. Seria um prazo para reorganizar as finanças.

– PS: Um acordo foi assinado com representantes do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers) como garantia de que o pagamento dos profissionais irá ocorrer em dia. Agora, apenas um médico faz plantão, a cada 24 horas, de segunda a sexta-feira. Só aos finais de semana e feriados são dois profissionais. A equipe reduzida atende a demanda – argumenta o diretor administrativo – e é compatível com o repasse mensal da prefeitura. Novos atrasos, portanto, não devem se repetir. 

– Exames laboratoriais: Voltaram a ser realizados na última semana, depois de uma interrupção nos serviços por escassez de recursos.

– Cirurgias eletivas: Não irão mais ser realizadas em Canguçu. O contrato, que previa 30 cirurgias e 240 consultas, foi suspenso. Os procedimentos serão referenciados ao Hospital de Piratini. Uma reunião nos próximos dias, com secretários municipais de saúde, deve colocar o tema em pauta.

 

Atendimento imprescindível e agradecimento

O bom humor que se espalha pela casa leva para longe os dias de pavor vividos pela família no final do ano passado. A luta para reanimar o jovem Anderson Pereira Braga, 23, durou infinitos 58 minutos, naquela quarta-feira, 2 de dezembro, em que a partida de futebol de salão foi encerrada por uma parada cardiorrespiratória. “Tenho certeza que se não tivéssemos a UTI à disposição naquele momento, o Anderson não estaria mais aqui conosco hoje”, destaca a mãe Carla Pereira, que passou a integrar uma comissão de moradores engajados em recuperar o hospital.

Foram 19 dias de internação e uma descoberta: ele e o irmão gêmeo, Andrey, possuem má-formação nas artérias e não podem fazer esforços físicos. A etapa ainda é de recuperação, mas a evolução tem sido rápida. Muito rápida. O caminhar já está perfeito. A letra, aos poucos, volta a ganhar forma e ocupa folhas e folhas de um diário elaborado em parceria com a terapeuta. “Quem me olha hoje nem diz que eu tive aquele troço”, descontrai.

Um mural com as atividades diárias serve de memória auxiliar. Anderson ainda apresenta dificuldades em lembrar atos, não raro, realizados há poucas horas. Nada que não possa ser enfrentado com originalidade e leveza… Ao lado da família: a mãe Carla, o irmão Andrey, a irmã Andreza e o pai Arion. Com direito a planos: retornar à faculdade; talvez não ao Direito. É uma decisão em fase de amadurecimento. Não há razão para atropelos. Só para agradecer.